11.7.08

O Dinheiro

Recebeu o troco e notou a frase escrita na nota de dez reais: “Deus é fiel”. Olhou atento para aquela frase por três segundo e depois tacou a nota no bolso esquerdo da calça Jeans e saiu.

Depois de um tempo, já na solidão e languidez de sua casa, ficou pensando porque alguém escreveria tal heresia numa nota. A heresia não seria pelo fato de Deus ser fiel, como diz a frase, mas pelo fato de alguém tê-la escrito numa nota que possui um determinado valor e serve como moeda de troca. Sendo assim, Deus pode até ser fiel (há quem pense o contrário!) mas o dinheiro só tem fidelidade a quem o possui e esta fidelidade se resume a um instante fulgás, até o momento em que ele é trocado por algum objeto qualquer; daí em diante a sua fidelidade pertence a outro, também por um momento fulgás.

Ficou pensando na contradição daquela frase no dinheiro: “Deus é fiel. O dinheiro, não!” Dizia ele para si mesmo. Depois de muito pensar, viu uma coisa positiva naquilo tudo e começou a avaliar a sua relação com o dinheiro: “e eu, sou fiel ao dinheiro?” Pensava preocupado. “Coloco o dinheiro como prioridade na minha vida?”. Depois dessas reflexões, viu que o dinheiro, pelo menos para ele, era apenas algo necessário para se obter alguns bens indispensáveis para manutenção da sua existência e não algo autônomo, com vida própria; apenas um meio para se atingir um fim e não o fim em si.


Para ele, a felicidade e satisfação da vida não estava ligada a posse do dinheiro. Assim, pensou nosso personagem, ele não era fiel ao vil metal e tendo chegado a esta conclusão tratou logo de passar a nota maldita pra frente e foi tomar uma cerveja no buteco da esquina. “Não sou fiel ao dinheiro. Sou fiel a mim mesmo, a vida, ao amor, aos amigos, a esta cerveja; a Baco e a Dionísio ao mesmo tempo”, dizia nosso amigo para si com longas risadas. Depois de tomar quatro cervejas (cada uma a R$ 2,50) entregou a nota ao dono da budega, que também não deixou de perceber a frase com letras garrafais. Estranhou e pensou por alguns segundos se aceitava a nota pra logo em seguida jogá-la na caixa registradora dizendo: “Deus é fiel?! Tô sabendo...



"Dinheiro é um pedaço de papel
(...)
Dinheiro tem valor quando se gasta

Um pedaço de papel é um pedaço de papel
Dinheiro não se leva para o céu".

Dinheiro.

(Arnaldo Antunes e Jorge Benjor)