A noite
E lá vinha ela caminhando na chuva tranquilamente. Sabia que não ia parar de chover tão cedo, então abraçou seu caderno contra os seios na tentativa de protegê-lo e seguiu caminhando tranquilamente na chuva que desabava do céu naquela noite de sexta-feira.
Enquanto caminhava ia pensando na vida e a vida passando por ela. Não se preocupou com nada, apenas seguiu seu caminho em direção agora já ignorada. Saiu na noite escura e chuvosa, queria apenas andar, andar... dizem que, à noite, a cidade se mostra com toda sua beleza, toda sua nudez, todo seu frescor, toda malícia e todos os perigos estão lá, dentro da noite.
Já se encontrava toda molhada, mas isso não lhe preocupava mais. Quanto mais andava mais sentia vontade de andar. Seguiu descendo as ruas que iam surgindo pela frente, dobrou esquinas, andou pelas calçadas, cruzou ruas e seguiu andando sempre em frente com todos os olhares voltados para ela estranhando tal pessoa perdida na noite com toda aquela chuva que caia.
Eis que então uma música lhe veio à cabeça, sorriu de imediato. Jogou seu caderno num canto qualquer da rua e sentiu todo aquele momento intensamente em seu corpo correndo como sangue quente nas suas veias. Olhou para o céu levando os braços em direção as nuvens, sentiu os pingos que caiam no seu rosto e, tomada por essa felicidade inexplicável, começou a se despir. Foi tirando peça por peça de sua roupa até ficar completamente nua. Não se importou com ninguém ali. Enquanto a chuva caia, ela dançava na noite debaixo dos olhares que não entendiam nada do que viam. Corria e gritava completamente nua naquele momento de êxtase total até a chuva parar. Ao findar da ultima gota, pegou sua roupa espalhada no chão, vestiu-se e foi embora.
Dizem que, à noite, a cidade se mostra com toda sua beleza, toda sua nudez, todo seu frescor, toda malícia e todos os perigos estão lá. Agora mais do que nunca ela sabia disso.
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